domingo, 13 de maio de 2007

De 9 a 13 de maio


Gracinha















Chokeq’iraw, 9 a 13 de Maio de 2007


Olá a todos! Aqui quem vos fala é um caco de homem. Hoje é dia 13 de maio, e acabei de retornar de uma jornada inacreditável e, movido a uma sopa caseira, feita por mim mesmo, aqui no Hotel que mais tem cara de casa de família em Minas, mais 1200mg de Ibuprofeno, tento escrever. Como diria minha amiga Patricia (VENHA-VENHA!), lá de Boston, uma sergipana porreta:


“Pensem vocês em um homem acabado, pensem no Bruninho!”

Paty, ti amu e to com saudades, mas você não me escreve, sua doidinha! Beiju pra ti e pro Des também!

Quando, na quarta-feira passada, estava aqui no hotel organizando tudo, junto com o rapazinho do hotel e meu guia, o Jiver, não fazia nem idéia das implicações da minha decisão de fazer esse hike até Choquequirao ou Chokeq’iraw. (Relembrando: trata-se de uma cidade Inca descoberta no inicio dos anos 20 e que, até 1996, não era Parque Nacional e o acesso aos turistas ainda não era regularizado. E até hoje ainda não recebe muitos visitantes e vocês vão entender o porquê.) Essa jornada, um verdadeiro “Programa de Índio”, veio a ser o maior desafio físico de minha existência (e olha que eu gosto de exercícios físicos e não costumo reclamar de nenhuma atividade do gênero) e, conseqüentemente, tornou-se um desafio mental inacreditável.

Quinta-feira, lá pelas 7:30 da matina, já estava saindo do meu quarto e o Raul me aguardava com um café-da-manhã reforçado, com ovos, queijo, pão, caldo de champignons e café. PS: Café aqui no Peru não é fresco e passado na hora, em nenhum lugar que estive no Peru (com exceção de Lima), café é só instantâneo ou um concentrado de café instantâneo, feito em uma jarrinha em que se mistura na xícara de água quente que lhe é trazido, seja lá de onde for.













O Jiver entra pedindo meu equipamento de camping pra amarrar no cavalo e acaba sentando pra comer algo também. Chomp, chomp, chomp… engole tudo e nos vamos. Ao iniciar nossa caminhada morro abaixo, em direção a Serra Nevada, estava encantado com o ambiente da cidade. Os nativos caminhavam em passos lentos, levando todo tipo de alimentos em sacos imensos, e todas as mulheres, invariavelmente, levavam em suas costas uma manta onde traziam suas crias, as crianças mais fofas que se pode imaginar.































Olha a vista dessa praça...



























Não pude deixar de me lembrar de São Tiago, 25 anos atrás. Como lá, galinhas e cachorros entre outros animais andavam livremente pelas ruas e o cheiro de lenha queimando me trouxe lembranças mais que agradáveis! Lembrei-me dos bons tempos, quando a vovó Alva ainda estava viva e tratava os netos como verdadeiros príncipes! Saudades d’ocê, vozinha!

Munido de minha máquina, saí logo tirando fotos de tudo e todos. Os primeiros 10 km foram uma beleza, o clima fresco tornava a caminhada agradabilíssima. Logo ao sair da cidade (300 m depois), cruzamos campos de milho onde dezenas de pessoas já pegavam no batente e os inúmeros cavalos comiam tudo que lhes convinha.













Chegamos a uma trilha lá embaixo no vale, e começamos a subir, de leve: sobe, desce, sobe mais, riachos, cascatas, casebres … o cheiro de mato, ervas frescas (não a danada!), e flores era quase overwhelming (me desculpem não achei a palavra em português). Continuamos e encontramos uma estradinha de terra que subia até o primeiro mirante. Até então, tudo tranqüilo... No caminho, avistamos o que é considerado o maior canyon da America Latina e, 10 km depois, chegamos ao dito início de nosso caminho!!! Puta merda, chegamos à beira de um verdadeiro abismo! Era tão grandioso e fundo que, após analisar as fotografias, conclui que elas não fazem juz ao tamanho verdadeiro da bagaça!




















Então, Jiver me aponta o dedo lá pra PQP e diz: Ta vendo aquele marronzinho lá naquela montanha? (Ahhhh? Procurei, procurei e lá na casa do caralho avistei um tracinho marron, no alto de uma montanha que parecia estar a anos luz. “ Lá é Chokeq’iraw”, disse ele. Olhei pra baixo, olhei pra cima, para onde ele havia apontado e perguntei: Como mesmo vamos chegar lá? E ele me aponta uns risquinhos na montanha, em forma de ZigZag, dizendo ser o caminho…Waw! Havia um grupo de três franceses que estavam ali, de retorno, e a única coisa que me disseram foi: “Good luck to you”. Xiiii, onde foi que amarrei minha égua? Bom, pensei, já que caminhei 10 km, o que são mais 24 km? Estou a 1/3 do caminho praticamente! Big, big, big mistake!!!O negócio é o seguinte: pelo fato de ser muito, mas muito, mas muito alto, o caminho não desce de uma só vez; desce, sobe, desce mais, sobe um pouquinho, desce um montão. É tão íngreme, tão íngreme que, ao chegar ao rio que lá embaixo passa, quase três horas depois, os músculos da coxa já estavam doloridos e a dor em ambos os joelhos era clara.














Primeiro Stop point

Paramos e Jiver cozinhou uma gororoba ( pra dar energia, vamos precisar, ele disse.). Comemos e descansamos um pouco, a dor nos joelhos não passava e comecei a me preocupar, principalmente porque, em todo meu currículo de esportes e atividades físicas, nunca tive problema algum com minhas “rodillas”.
Atravessamos a ponte de madeira e cabo de aço sobre o rio, que de cima parecia ser pequenino, mas que, de perto, era um turbilhão de águas rápidas e devia ter uns 100m de margem a margem. Se a ponte se quebrasse, só iriam nos achar a muitos km de distância. Perguntei a ele até onde iríamos; “Santa Rosa, creo que llegamos en dos horas e media, o tres horas”. Não preciso nem dizer que daí pra frente foi só subida, aliás, quase uma escalada! Uma hora depois comecei a sentir câimbras, e logo, logo minhas duas pernas travaram ao mesmo tempo. Jiver estava a uns 300m a frente, mas, como o caminho era em ZIGZAG e super íngrime, não foi possível que me avistasse de forma alguma! Tentei gritar e nada de resposta, nada... novamente e nada… pensei: Putz, será que minha historia vai virar episódio daquele programa da Discovery Chanel “I Shouldn’t be alive?” OBS – Em Português se chama “Sobrevivi”. Que nada!!! Mais cedo ou mais tarde meu guia dará falta de mim e me acha. Ali me sentei e tentei alongar um pouquinho, tirei duas bananas e uma barra de chocolate que tinha na mochila e mandei pra dentro. Em mais uns 15 minutos depois, escuto Jiver me gritando de um cotovelo onde conseguia me avistar : “Que passa, mano? Estas bien?” Disse que ia descer e eu recusei; minhas coxas estavam um pouco melhores e resolvi encarar mais uma hora e meia de subida que me restavam até Santa Rosa.




Mirante

















Era isso ou baixar uma hora e meia até o Rio, e meus joelhos doíam tanto que agüentar a subida e as câimbras me pareceram a decisão mais sábia. Fui indo com os músculos travando a cada meia dúzia de passos que pareciam não me levar a lugar nenhum, mas que eventualmente me levaram ao encontro ao meu guia. Ele então me seguiu até a chegada a Santa Rosa, uma hora depois, sempre me encorajando e nunca me deixou desistir entre as paradas reservadas para as câimbras. Embora fosse quase fim de tarde, o clima frio da montanha não parecia refrescar, já não tinha mais minha jaqueta, meu gorro nem calças (Mulherada, não se empolgue, usava duas, viu?) Detalhe, uma camisa de manga cumprida e chapéu são indispensáveis o tempo todo por causa do número imenso de mosquitos e pernilongos, de todos os tipos e tamanhos, que querem um pedacinho de você.




Santa Rosa
Pop. 2 Hab.








Muitas câimbras depois, alcançamos Santa Rosa, uma “comunidade” de dois (2?) habitantes…hãhã, isso mesmo, tem até plaquinha anunciando! Somente dois habitantes, o Ricardo (acho que era esse mesmo o nome do rapaz, pois, eu estava muito cansado e com muita dor pra prestar atenção em detalhes como esse) e seu pai. Só um casebrezinho e uma taperinha de bambu onde o Ricardo vendia chocolates, refrigerantes, cerveja e outras cositas mais (tudo quente, é claro, não tem eletricidade) e um radinho a pilha que, sintonizado à única rádio da região, a rádio municipal de Cachora, tocava músicas folclóricas em espanhol e na língua local, o QUECHUA.




Jiver e Ricardo















Seu pai chegou mais tarde com um TUFO de cana do tamanho de um carro e não deu muita bola pra nós não. Eles produzem caldo de cana e uma pinguinha também (só bebendo mesmo pra viver ali...). O Ricardo tem problema em uma das pernas e anda com uma bengala, provavelmente de subir e descer essa cordilheira maluca. Perguntei a ele se ia muito a “cidade” e ele me disse que a cada quatro ou cinco meses. “Me gusta la vida sensilla!” ; e põe sensilla nisso: (Sensilla=Simples) sem luz, sem chuveiro, sem privada, sem MULHER, o caboclinho tem que ser bom de… deixa pra lá! Hehehe.

Enquanto eu tentava esquecer a dor no joelho e nos músculos, enquanto Jiver acendia o fogo pra fazer o rango. Já escurecia e o silêncio do local era absoluto. Antes de se retirar, Ricardo me trouxe uma pomada de alguma-coisa-que-não-sei-o- quê, mas que sei que continha folhas de coca, pra eu passar nas pernas quando fosse me deitar, e se foi. Tomei um banho “cheko” na bica gelada, lavando só o essencial... O rango tava uma beleza; franguinho frito, arroz branco e tomate! Após o jantar, um chazinho de coca bem quente pra poder ir dormir! Isso mesmo, já vinha eu o dia todo tomando chá de coca! Não dá barato nenhum, podem ficar despreocupados; somente dá mais energia e tira a fome. É muito gostoso, tem um cheiro e um gosto bem distintos e fortes. Parece um chá de camomila melhorado, quando sem açúcar, e também com garapa, quando adoçado.

O cheiro da mata aqui é inacreditável: alecrim, anis selvagem e milhares de outras flores, que perfumam todo o ambiente. Mas, o que mais me impressionou foi o CÉU... Inacreditável! Essa é a única palavra que achei pra descrevê-lo. Só me dei conta dele quando apagamos a fogueira e me retirei para a minha barraca, e ali fiquei, pela tela, admirando aquela imensidão de estrelas, as quais estou certo de nunca ter avistado em toda minha vida, nem mesmo em São Tiago! Nesse momento me passaram milhares de coisas pela mente: solidão, saudades diversas, pessoas das quais sentia falta... porém, ao mesmo tempo, um sentimento de PAZ inacreditável e indescritível. Quase..., quase entendi porque alguém podia viver em um lugar tão distante e diferente do mundo lá fora. Esqueci-me das dores do corpo e, às 8 da noite já estava dormindo ZZZZZZZZZZZZZZZZZZ.

Cinco e meia da matina já escutava o Jiver caminhando pra lá e pra cá, acendendo o fogo pra fazer o desayuno. Eu me levantei e as dores do joelho pareciam ter melhorado um pouco, mas os músculos ainda me doíam muito! Comemos bem e empacotei tudo que tinha e saí na frente de meu guia que ainda tinha que amarrar tudo no cavalo antes de partirmos. Fui “adelantando”, mesmo porque sabia que meu ritmo não seria dos mais rápidos. Sobe, sobe, e sobe mais um montão! Uma hora depois Jiver me alcança e pergunta se estou bem. Tudo OK! Tirando as dores, é claro! Mas, não havia nada que podia fazer a não ser engolir e prosseguir viagem. Ah, meus antiinflamatórios, os que deixei no hotel estavam fazendo uma falllllta!!!! E o ar mais rarefeito não contribuía muito para recuperar o fôlego!
































Depois de umas quatro horas, Jiver me diz: Só faltam umas sete curvas pra chegarmos a MARAMPATA. Trinta minutos depois chegamos a essa comunidadezinha de umas cinco casinhas, todas de membros da mesma família. Aliás, a família de Raul, o rapazinho do hotel. Montamos acampamento ao lado da casa do Sr. Antonio e de Muriel; respectivamente Pai e irmão de Raul, fizemos um lanchinho pro caminho até Chokeq’iraw- que estava ainda a duas horas de caminhada, entre subidas e descidas um pouco mais leves.








Ali, na
PQP...







Quase lá





























Seguimos caminhando, e percebi que meu joelho direito não estava nada bem, mas, o esquerdo, por milagre, estava muito bem. Nesse ponto sentia dores em músculos na perna que nem mesmo sabia que existiam, mas, como havia passado por tanto, estava decidido a chegar ao meu destino, não importava o que acontecesse. Ao nos aproximarmos dos portões da cidade, avistamos várias construções que estavam escondidas pelo mato e árvores, inacessíveis para visitação. Foi só então que descobri que Chokeq’iraw era muito mais extenso que Machu Pichu, porém, mais de ¾ ainda não foi limpo e restaurado.

Parte agrícola andina de Chokeq’iraw













Ao entramos pela “porteira” de entrada do parque, havia várias trilhas que levavam a diferentes partes da cidade, (algumas por mais de uma hora de caminhada!) e uma que levava a Machu Pichu. “Podemos caminhar mais sete dias e chegamos lá”, Jiver! Hahaha, nem pensar! Tem louco pra tudo, né? Enquanto o Jiver se ajeitou em uma sombrinha na praça central da cidade, eu resolvi ir tirar umas fotos lá do mirante, um bocado pra cima ainda.









































































Chegando lá, eu me sentei na muretinha e fiquei apreciando a paisagem, especialmente uma cahoeira que, de seu ápice até o rio, lá embaixo, tem mais de 1.400 metros de altura. Breathtaking!!! O Jiver me informou que, do outro lado do canyon, havia uma outra cidade chamada Incamapata (????)(ou algo assim, não consigo guardar todos os nomes) e que os habitantes se comunicavam por fumaça! Imagina só: viver aqui há centenas de anos? Tinham mesmo que achar o que fazer, nem que fosse sinal de fumaça! Hahaha!


















































Quase uma hora depois resolvi descer pra comer algo e seguir caminho de volta a Marampata porque a caminhada não era fácil. Foi então que me dei conta do tamanho do buraco que havia cavado e compreendi a extensão da minha lesão no joelho direito. Talvez seja problema de DNA (Data de Nascimento Antiga) hehehe! Afinal, ali era exatamente metade do caminho! Ao dar os primeiros passos para baixo, a dor no meu joelho direito era indescritível e logo no terceiro passo ele me falhou e o desloquei, deleve....AHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH!!!!!!!!!! Pra quem não notou, esse foi meu grito de dor! Caí que nem uma jaca e por ali fiquei quase 10 minutos antes que conseguisse respirar fundo e me levantar com a perna meio que torta. Engoli seco e juntei com toda a força que conseguia aplicar, com meus músculos doloridos. Clack!!! Entrou no lugar novamente e a dor foi tão grande que nem gritar eu conseguia! Saí arrastando a perna. Na metade do caminho entre o mirante e a plaza central, encontrei o Jiver que vinha ao meu encontro pra saber o que se passava. Ajudou a chegar até a sombra onde estavam nossas tralhas e lá comemos e ficamos por quase uma hora, até que eu conseguisse levantar. PS: Sé estávamos nós e o porteiro na cidade toda! Descolei uma bengala improvisada e, arrastando a perna, segui caminho de volta a Marampata. Pedi ao Jiver que fosse à frente para que eu pudesse colocar meu próprio ritmo, sem ter que me preocupar se estava indo rápido o suficiente! Fui de bengala e arrastando a perna direita todo o tempo e, a cada poucos metros, me apoiava de alguma forma – nunca muito boa - e os grunhidos de dor saíam cada vez com muito mais freqüência. E olha que geralmente não dou muita bola pra dor não, quem me conhece sabe. Mas, já havia estourado meu limiar de tolerância muito tempo atrás.

O Jiver foi muito bacana e a cada 15 ou 20 minutos encontrava-o parado, esperando pra saber se estava tudo bem. Aí, caminhava um pouco mais. Assim fomos até Marampata e, chegando lá, nós nos sentamos na cozinha do Sr. Antonio e tomei a melhor cerveja quente da minha vida!!!



















Enquanto Muriel cozinhava um caldo de galinha caipira, seu pai ia buscar umas ervas pra fazer um ungüento pro meu joelho. Putz, comi que nem um louco e fui me deitar ao sol, na grama,ao lado da minha barraca; esfriou e saltei pra dentro.















Lá pelas 6:30, o Jiver me acorda pra jantar: galinha caipira, pamonha, arrozinho, tomate e mandioca!!!! Putz, que beleza! Meu joelho doía mas não mais de forma insuportável. Comi, escovei os dentes e às 7:30 estava dormindo (meu record!). Surpreendentemente, tive uma ótima noite!Na noite anterior, Muriel saiu pra tentar arrumar um cavalo pra me levar de volta. No início dessa viagem tive a opção de ir de mula, mas, por dó das bichinhas, resolvi ir caminhando mesmo (se eu soubesse!!!!!!).





















Muriel e suas penosas
Muriel chegou pela manhã, no dia seguinte, e me informou que todos os cavalos da comunidade estavam em trânsito; teria que caminhar mesmo! Putz!!! Tomei café e fui adelantando, arrastando a perna direita, usando agora uma segunda bengala pra tirar um pouco mais de pressão dos meus passos naquela baixada sem fim! Pedi ao Jiver que não caminhasse comigo e que me seguisse, talvez uma hora depois.
A cada 20 metros um grunhido de dor e milhões de coisas passando por minha cabeça; a frustração me acompanhando a cada passo dolorido do caminho. De vez em quando descontava minha raiva xingando todos os tipos de FUCKS possíveis e imagináveis. Até sobrou para os cactus que encontrava no caminho, golpeando-os com minhas bengalas. Os mosquitos tentavam me comer vivo e, por isso, não colaboravam pro meu bem-estar. Peguei um ritmo, engolindo a dor, pensando que uma hora ou outra meus receptores de dor se estressariam e atingiriam um nível de dor mais crônico e aceitável! Dito e feito, meio que anestesiado pela própria dor, consegui ir descendo os nove quilômetros de baixada até o rio, onde, só então, fui alcançado pelo meu guia.
No caminho, encontrei dois turistas: um americano, o Scott, e um peruano, o Fernando, que estavam sendo resgatados por cavalos que seu guia havia descolado. Sonhei com um “cavalito” mas ficou só no sonho. Chegando lá embaixo, na ponte, tomei uma água, sentei por uns 10 minutinhos e logo segui viagem, não queria esfriar muito e segui rumo ao acampamento onde iríamos passar a noite, uns 4 km acima... ainda... O sol estava pegando mas, não podia me livrar das roupas por causa dos mosquitos e mesmo do sol. Quase tive um piripaque, mas, finalmente alcancei o acampamento. Lá, entrei embaixo de uma bica de água e esfriei o corpo por quase meia hora! Esqueci de mencionar que, ao sair de Marampata, encontrei um casal de ingleses que estava subindo a Chokeq’iraw e que ainda iriam enfrentar a trilha ate Machu Pichu. Eles me deram meia dúzia de antiinflamatórios que, com certeza, auxiliaram minha descida.Depois de jantar, eu me deitei na barraca e mais uma vez fiquei observando o céu e pensando na vida pra esquecer a dor. Assim, às 6:45 já estava dormindo (novo record!). No dia seguinte, despertamos às 5 da matina, porque os 7 km de subida não eram nada fáceis e tínhamos que percorrer a maior parte desse caminho, antes que o sol fritasse nossas moleiras. Mais uma vez, engoli em seco e me pus a caminhar, arrastando a perna e com as duas bengalas que haviam enchido minhas mãos de bolhas. Lá pro meio-dia alcancei o primeiro mirante, o ponto mais alto da subida! Ainda havia 10 km até Cachora, mas uma sensação de alívio e ACOMPLISHMENT tomaram conta de mim e me senti bem melhor. Depois de cinco minutos de descanso e um papinho com um casal de turistas belgas que iniciava sua jornada, me mandei em um ritmo alucinante, mirando a cidade que ainda estava a 10 km, mas que, pra mim, não parecia muito longe devido ao terreno não ter mais extremos de subida ou descida. Jiver ficou pra trás e só me alcançou na esquina do Hotel, onde me sentei e tomei quase três litros d´água. Fiquei sentado à mesa por quase uma hora, antes de conseguir me levantar pra tomar meu primeiro banho em quatro dias!!! Isso mesmo, nos últimos dias, só banho “cheko” de água muiiiito fria. Surpreendentemente, não tava muito fedido, provavelmente por me lavar com água de Alecrim do mato, mas, mesmo assim, tenho certeza de que nenhuma gata se aproximaria de mim em tais condições! HeheheUma hora de banho e saí pra comer e usar a Internet.
Cachorra em
"Cachorra"
Isso mesmo, nessa vilazinha aqui tem um lugarzinho que tem internet! Devagar, quase parando, consegui falar com meu maninho Samukha que se conectou ao MSN, depois de uma chamada telefônica da Paty Mello, maninha do Potro. Valeu mesmo, Paty!!! Mandei recado de Feliz dia das Mães pra minha veinha (Que provavelmente não o recebeu...) e retornei ao hotel pra tirar uma soneca. O problema e que não conseguia dormir nem por nada; levantei e fui pôr minha roupa (nojenta!) pra lavar e dei um banho na minha moto. Aí sim, consegui tirar uma soneca! Acordei há umas duas horas e resolvi pôr tudo por escrito. Estava um pouco ansioso pra dividir com vocês essa experiência extrema pela qual passei nos últimos quatro dias. Tenho certeza de que - se tiveram paciência de ler tudo - todas as reclamações, no final das contas, valeram como experiência de vida. Acho até que o manezinho do grupo RAPPA já fez essa viagem: “ Se meus joelhos não doessem mais!!!”... Valeu a pena, eh eh, valeu a pena! Boa noite a todos e mais que nunca: saudadessssssssssssssssssssssssss!!!!

quarta-feira, 9 de maio de 2007

De 4 a 9 de maio

De 4 a 9 de maio















Peru, dia 4 de maio
Já eram mais de 5 da tarde quando peguei a estrada em direção à primeira cidade aqui no Peru, chamada Tumbes. É impressionante como a paisagem muda drasticamente assim que se cruza a fronteira: de um lado, no Equador, tudo muito verdinho e chovendo sempre... vinte minutos de estrada chego ao litoral peruano, tudo começa a ficar marrom e mais marrom, e marrom ficou por muiiiiito tempo. Passando por Tumbes, pedi umas informações e resolvi tocar mais um pouquinho pra comer alguma besteira. Parei em um quiosque frente ao mar e duas meninas e um senhor me pegaram de papo. Aí começou a bater o cansaço.














Os sol estava se pondo no Oceano Pacífico, tirei umas fotinhos e resolvi procurar uma hospedagem por ali mesmo. O lugar se chamava ZORRITOS e encontrei um hotel, o COSTA AZUL, pertencente a um camarada chamado Juan Carlos e lá fui muito bem recebido.





































O hotel ficava na areia da praia e tinha piscina, internet e tudo mais, porém, foi só banho, jantar, e cama. No dia seguinte, tomei rumo sul, e só então compreendi como toda a costa do Peru é desértica. Passei por Cabo Blanco, uma cidadezinha pequenina onde avistei turistas e onde a prática do surf é o motivo principal para estes estarem ali. Não parei e, de Cabo Blanco em diante, só vi areia, MUITO vento, e nada de vegetação, nem mesmo uma graminha sequer. Só para vocês terem uma idéia, de ZORRITOS até NAZCA (ao sul de Lima) são mais ou menos 1.400 km de NADA, de deserto puro. Depressão total! Dirigi quase o dia todo, passei por cada lugarzinho que dava medo até de olhar. Muita sujeira, muito lixo, muita gente mal encarada. Todas as cidadelas FEDEM muito e são muito sujas. Não sei nem de onde sai tanto lixo. Cheguei a uma cidade um pouquinho maior que se chamava PIURA e, ao abastecer, olhei meu pneu traseiro e vi que estava mais do que no talo… Com os arames já à mostra, decidi que não conseguiria chegar a Lima para ir a uma concessionária da BMW e trocar os pneus, principalmente porque de PIURA a CHICLAYO são 260 km de um deserto chamado “deserto de OSMO” (se nao me engano) Essa informação recebi de um curioso que no posto de gasolina olhava a moto. What are you talking about? Não entendi, porque até agora tudo era deserto... Então ele me informou que estes eram 260 km sem nada no caminho, somente a estrada e mais nada. E a idéia de ter um pneu estourado no meio do deserto não me agradava muito.

Aridez de OSMO ( que quer dizer Osmonte de areia)
































Então resolvi ir a um lugar onde se “cambiavam las llantas” (pneus). Achei uma loja da Goodyear. Ao entrar, logo uns 10 funcionários se aproximaram e ficaram a observar a moto e a fazer aquelas perguntinhas básicas que vocês já sabem. O gerente, logo de cara, me disse não poderem trocar porque não tinham as ferramentas pra soltar a roda. Mas, como eu havia dito, um motoqueiro prevenido vale por dois: desmontei minhas malas e saquei as chaves que servem nos parafusos. Obs.: todos os parafusos da BMW são em formato de estrela, chaves comuns não servem. Bom, havia umas cinco pessoas trabalhando na moto, um soltou os parafusos enquanto os outros aguardavam a saída da roda... UFA… SIMPLERRIMO! Eu achei que teria que tirar o disco, cilindro e etc, mas esse não foi o caso, pois, as peças ficam presas ao chassi e ao cardan que, pelo fato de ser unilateral e não ter corrente, foi só soltar os cinco parafusos e a roda saiu.
Tinha tanta gente querendo ajudar que eu achei que nunca iam terminar porque todos queriam pôr a mão. Resultado, em 10 minutos as rodas estavam colocadas e apertadas e, depois de pagar a incrível quantia de quatro soles (ou seja: 1,30 dólares!) me fui. Não se enganem com o preço muito baixo, as coisas aqui no Peru não são tão baratas assim, só acho que o gerente da loja ficou tão empolgado que me cobrou um preço simbólico. (Imagino...) Obs.: A moeda nacional no Peru se chama “Sol”, cuja cotação é de 3,15 em relação ao dólar.
Então me fui, tomei a carretera para Chiclayo, e tome areia… um vento que soprava da minha direita, do oceano, fazia com que tivesse que pôr minha moto sempre inclinada para a direita para que conseguisse caminhar reto, o que aumentou o consumo de combustível em mais de 35%, segundo meus cálculos. Vento fortíssimo, sol, areia pacas e muito lixo à beira das estradas. Depois de pilotar quase o dia todo em uma reta que não tinha mais fim, em um deserto que não tinha mais fim, passando por cortiços e mais cortiços (porque não se pode chamar aquilo de cidades ou mesmo vilas), cheguei, já à noite, a uma cidade chamada TRUJILLO. Essa sim era uma cidade maior e com muita gente perambulando na rua. Bem no centro da cidade encontrei um hotelzinho e ... banho, barba e saí para comer.
Ao retornar ao hotel, conheci um casal de senhores ingleses que vivem na Austrália. Eles me contaram que um grupo de policiais havia meio que confiscado a carteira de motorista deles, caso não pagassem a quantia de 340 soles (mais ou menos 110 dólares), afirmando que eles estavam acima do limite de velocidade, muito embora não tivessem radar e estivessem em uma curva, bem na entrada de uma cidadezinha (favelinha diria eu). Receberam o dinheiro e não deram nenhum tipo de comprovante nem nada…. É lógico que foi pro bolso!!! No dia seguinte, levantei cedo e tomei o rumo de Lima que ainda estava longe pra burro. Umas três horas depois, passo por um pedágio (moto não paga...) e, do outro lado das guaritas, um policial faz sinal pra eu parar. Começa a perguntar de onde sou, de onde venho, quanto vale a moto, quanto corre a moto, etc e tal. NUNCA pediu pra ver nenhum documento. Então me pede pra dar uma voltinha na moto. Ahhh? Nem pensar! - eu pensei, mas muito gentilmente me recusei e disse que ficava pra próxima. Imagina só: toda minha bagagem, com câmera, laptop, ferramentas e etc. Imagina se esse maluco resolve sumir? Que eu ia fazer? Nem pensar!!! Já estava com a pulga atrás da orelha por causa da história dos ingleses com os policiais e também porque o Juan Carlos havia me dito pra ficar espertos com eles. Rapidinho dei linha na pipa e me fui!
DESERTO, DESERTO, AREIA, VENTO, LIXO, CORTICOS, MAIS LIXO, MAIS DESERTO. Ao me aproximar da cidadela de Barranca, encontrei as ruínas da FORTALEZA DE PARAMONGA, que foi construída pela civilização CHIMU e que era usada para estudos de Astrologia. Parei e da estrada mesmo tirei umas fotinhos.

















Assim que subi na moto, uns 400 m depois, havia uma curva e eu estava ainda muito devagar, tentando ajeitar os fones de ouvido metendo as mãos por dentro do capacete e lá estavam eles…. Os tais policiais! Um senhor fez sinal pra eu parar; o oficial PERALTA (olha que nome!) E logo já veio dizendo que eu estava acima do limite de velocidade, me perguntou de onde era, de onde eu vinha, pra onde eu ia e eu com muita calma fui respondendo a tudo. Pediu minha carteira de motorista e ficou com ela na mão; abriu um livrinho me mostrando o preço de uma multa por excesso de velocidade: 340 soles! (Exatamente a quantia que o casal de ingleses pagou) Mas, por eu ser muito educado e um cavalheiro, ele poderia quebrar meu galho e eu pagaria só a metade. PS: no livrinho havia também uma coluna com todas as multas com 50% de desconto. Mostrou o quanto teria que pagar pra poderem liberar minha carteira. Putz… não sei o que me deu e eu comecei a falar: “Meu amigo, eu estou aqui viajando numa boa, não fiz nada de errado e estou escrevendo uma historia sobre essa viagem. Até agora, só tenho coisas boas a contar e gostaria muito poder escrever coisas boas sobre o país e sobre as pessoas daqui.” Disse também que eu não carregava dinheiro comigo, só cartão e que eu pagaria a multa por inteiro junto ao Departamento de Trânsito, em Lima. Ele então me perguntou se não poderíamos ir até um posto de gasolina e, com meu cartão, eu poria uns galões de combustível no carro patrulha. Eu logo disse que NÃO, que preferiria pagar a multa em Lima. Ele esboçou novamente a insinuação que poderia reter minha carteira de motorista e aí eu desandei a falar: “O senhor pensa que não sei de nada? Este documento é um documento emitido pelo Governo Americano pertencente a mim, e sei que o senhor não pode retê-lo, caso o faça, eu vou embora e, em alguns dias, tenho certeza de que vou tê-lo de volta. Aí será o senhor quem terá que se explicar. Se quiser me multar, por favor faça-o, mas, como eu não estava fazendo nada errado, não estava correndo e vocês nem mesmo têm radar, não acho que seja justo. E o senhor parece ser um “cavallero” e estou certo de que não tem a intenção de me prejudicar.” Putz… eu estava fumegando de raiva, mas penso não ter deixado transparecer muito. Acho que ele não esperava pela reação e meio que perdeu o rebolado; devolveu minha carteira e me desejou boa viagem. Ainda tentou me passar um sermãozinho, dizendo pra eu ser mais cauteloso, bla, bla, bla.. mas nem mesmo esperei ele terminar e já disse: “Hasta la vista!” e me fui.
PQP, estava totalmente decepcionado com o Peru (O país Peru, ta? Pra vocês com a mente poluída). Estava tão puto que pensei em nem passar por CUSCO para visitar Machu Pichu. Havia guiado mais de 1000 km por desertos, favelas e lixo, e ainda vem um filho da puta tentar arrancar dinheiro de mim? Vai se fuder!!! Parei uns 2 km depois quando notei que meus fones de ouvido estavam pendurados quase arrastando no chão; tinha saído com tanta pressa e raiva que nem havia percebido. Então, coloquei ENYA pra dar uma relaxada e logo, logo estava tranqüilo. Finalmente cheguei a LIMA... assustador!!! Cortiços e mais cortiços, sujeira, fedor etc… Resolvi passar direto, mas, quando cheguei à parte mais ao sul da cidade, resolvi sair da rodovia e entrar para abastecer. Entao…. tcham tcham tcham tcham... por sorte, havia entrado na parte boa da cidade, que alívio, parecia estar em outro mundo! Em questão de segundos, saí do LIXÃO e entrei numa parte da cidade onde tudo era LINDO: avenidas, casas, árvores, flores, cafés, restaurantes, lojas tudo do mais altíssimo nível de qualidade e refinamento. Bonito messsssmo!!! Ainda estava meio em choque porque não esperava tal melhora e por ali mesmo resolvi achar um hotelzinho e ficar. Se algum de vocês, um dia resolver vir a Lima, fiquem na região sul (MIRAFLORES, SURQUILLO e SURCO). Vale a pena!
Depois de me instalar e tomar banho, fui caminhando por algumas quadras, apreciando tudo que via. Achei uma pizzaria de uns argentinos e pedi logo uma grande pra levar para o hotel. Acontece que a filha dos donos, a Maria Paula, foi quem me atendeu e me pegou de papo por mais de uma hora. Ela me deu várias dicas de onde ir e o que fazer na cidade. Lima não é muito barata não, dei uma olhada nos restaurantes e cafés e tudo é bem caro, embora todos apresentem qualidade altíssima, são bem modernos e sofisticados. Valeu a pena eu ter entrado por lá. Retornei ao Hotel e comi pizza assistindo à GLOBO, isso mesmo, Globo! Vi os gols das finais dos campeonatos estaduais e também o Jornal da Globo que mostrou um monte de merda que estava acontecendo em São Paulo, durante um show dos Racionais, na praça da Sé, onde a galera quebrou tudo!
No dia seguinte, fui procurar a concessionária da BMW pra trocar óleo, filtros e provavelmente meu pneu dianteiro, muito embora não estivesse tão gasto. Sei que só vou poder trocar numa autorizada, pois, é bem mais complicado que o traseiro. Localizei-me no mapa e encontrei uma super concessionária, gigante, com dezenas de carros e funcionários. Mas, eles não tinham em estoque tudo que precisavam (filtros de óleo e ar) e demoraria em torno de 10 dias para receberem via correio. NEM PENSAR! Putz… vou ter que ir até La Paz, na Bolívia? E se eu chegar lá e eles não tiverem as peças também? Bom, vou tentar passar um e-mail pro Bill, o gerente da concessionária onde eu comprei a moto, pra ver se ele pode ligar de lá (ou mesmo mandar as peças) para que, quando eu chegar a La Paz, não tenha que esperar para fazer uma simples troca de óleo e filtros, né? Bom saí de lá ainda era manhã e resolvi pegar a estrada em direção a NAZCA. Alguém aí não ouviu falar nas “Linhas de Naszca?”

El Colibri










Bom, são desenhos feitos nas areias do deserto por uma civilização que precedeu a civilização INCA. Ninguém sabe ao certo a procedência dessa civilização ou o significado das linhas nem as datas corretas delas; acreditam ter sido feitas entre 400 a.c e 800 d.c , e ocupam uma região de mais de 500 km. Esses desenhos ainda estão quase intactos pelo simples fato de NAO CHOVER- nunca - por aqui, nessa parte do país… entre a cordilheira e o oceano. Aliás, tirei nesses quase 1.500 km, desde a fronteira até Nazca, muito poucas fotos, porque uma seria a cópia da outra! DESERTO, DESERTO E MAIS DESERTO.
Ao chegar a Nazca, vi três motoqueiros encostando em um hotel e resolvi ficar por lá também. Assim que entrei, eles se apresentaram e por ali mesmo, ao lado da piscina ficamos de papo. Dois deles, o Adam e o …(ESQUECI) são turistas ingleses que contrataram o outro camarada, o holandês, o (ta bom, esqueci também), que vive em AREQUIPES, uma outra cidade mais ao sul, e que vive de organizar viagens de moto por toda a América do Sul. Ele já levou até grupos daqui ao Rio de Janeiro, vive disso e sua clientela é, principalmente, européia; o que me deu uma ÓTIMA IDÉIA: fazer o mesmo no Brasil e, através da INTERNET, buscar clientes europeus! Quem sabe, né? Ficamos ali, de papo, e depois, mais tarde, nós nos reunimos e caminhamos até a praça central para jantarmos. Que galera gente fina!!!!!




















Convidaram-me para ir com eles pela manhã fazer um vôo para ver as “linhas de Naszca”. Hesitei um pouquinho, mas, depois aceitei. Custa 40 doletas, mas vou passar por Nazca e não ver as Linhas de Nazca? Não fazia sentido nenhum!










































Retornamos ao hotel e ainda ficamos de papo furado por um tempão, até que pedi arrego e fui dormir, afinal havia pilotado um monte naquele dia. Oito da matina, breakfast, e às nove vieram nos buscar para levarem-nos ao aeroporto. O vôo dura em torno de meia hora somente, mas, tivemos a chance de tirar fotos e curtir. Programinha bem rápido e bom pra gringo mesmo; as linhas de Nazca se estendem por centenas de quilômetros, mas só nos mostram as que estão próximas da cidade e as que conseguiram identificar; há muitos outros desenhos que não fazem nem idéia do que sejam.


































Chegamos ao hotel ainda era de manhã e eu resolvi pegar a estrada em direção a CUSCO. Sabia que não ia conseguir percorrer os seiscentos e alguns quilômetros em uma tarde, na verdade nem mesmo em um dia, porque as curvas da cordilheira não permitem.













Empacotei tudo, despedi da galera e me fui! Peguei a estrada em direção a PUQUIO e, em um trecho de 70 km, subi do nível do mar até 4.600 metros de altitude, com tantas curvas que quase se podia ler a placa da moto... e muita poeira!

Parece uma cidadezinha feliz










Ahhh, observação: As estradas aqui são, de uma forma geral, muito boas mesmo. Até chegar a Nazca, praticamente retas e muito poucas curvas e subidas, mas também tenho que dizer que o número de veículos circulantes e ínfimo. Devo ter cruzado com aproximadamente duas centenas de veículos, no máximo, em quase 1500 km de estradas. Voltando ao assunto, quase chegando ao topo da serra, parei numa biboquinha onde comprei um pedaço de bolo de milho, um queijo fresco e água. Por tudo paguei 6 Soles (2 doletas) e fiquei conversando com um senhor (Hidalgo) que queria porque queria saber porque eu não tinha esposa e filhos! HAHAHA, nem tentei explicar porque ele não ia entender mesmo! E quando eu ia caminhando ele me disse que era pra eu retornar daqui a um tempo e trazer meus filhos pra ele conhecer. Hehehe Bem, uns 20 minutos depois, ao me aproximar do alto da cordilheira, em uma área que se chama “Pampas de Gallera”, em um planaltão imenso, onde o marrom do deserto começa a se tornar verde, avistei uma graminha, e mais outras e outras...

















é nóis nos "Pampas"


Quando cheguei à parte mais alta, as curvas se acabaram e tudo ficou plano e a vida resurgiu! Pastos, lagos, pássaros, flores e muitas, mas muitas llamas! Parei e comecei a caminhar em direção a esses animais tão simpáticos. Pareciam não se incomodar com minha presença, mas também não deixaram que me aproximasse mais de uns 10 metros.


Isso é que é ovelha...













A vegetação ainda era tímida em cor e em tamanho, mas já tomava conta da paisagem. Água!!! Substância essa que não avistava havia mais de 1600 km! Então, uns 20 km depois de iniciar meu percurso nos Pampas de Gallera , passei por um portal mágico para um outro mundo, assim que comecei a descer pelo outro lado da cordilheira!!!! WAW, WAW, WAW, WAW, WAW!!! E só o que consigo dizer pra descrever a sensação que sentia naquele momento. Foi uma das emoções mais impressionantes que já senti: passar de um dos lugares mais secos do planeta, mais inóspitos, onde não se avistava nem um bichinho, nem uma flor sequer; para um “mundo” cheio de vida em questão de MINUTOS!!! WAW, WAW, WAW!!!! Era tudo que conseguia pensar. Este lado da cordilheira é de encher os olhos de qualquer um! Especialmente de quem vinha viajando há quatro dias por um deserto que não parecia ter fim! Foi como se tivesse me conectado a uma fonte de energia infinda e, em segundos, recarregado minha bateria interna! Quase como a sensação que tive ao chegar a TIKAL na Guatemala.





























Todos os sentimentos ruins e de desânimo que havia tido em quase todo o meu trajeto pelo país, de repente, “não mais que de repente”, pareciam uma memória distante agora! WAW,WAW, WAW!!! Fazia frio, é claro, a 4600m só podia fazer frio. Logo,logo, parei a moto e me sentei à beira do penhasco e por ali fiquei estático, atônito por um tempão! O som dos diversos pássaros e do vento eram os únicos ali, até aquele momento. Carros? Nem sinal! De vez em nunca passava um!
O tráfego intenso já justifica
a duplicação da pista.















Um gavião planava, estático, por vários minutos, só procurando uma presa lá embaixo, muito lá embaixo...














Tirei minha câmera e fiquei ali observando o que ia acontecer; somente uns 10 minutos depois ele deu aquele mergulho e desapareceu da minha vista. Se pegou algo? Não sei, mas valeu a pena ficar ali só de bobeira, escutando os animais e vendo tanto verde, milhões, bilhões de margaridas amarelas, árvores, e muita VIDA, até onde a vista alcançava!












Desde o início do Pampas de Gallera, nas montanhas mais altas, já se avistava neve e, durante a descida, esta começa a fazer parte de minha jornada por uns minutinhos. A princípio começa a cair gelo, pedrinhas bem secas de gelo, que depois viraram floquinhos pequenos de neve e depois uma chuva com gelo, até que virou somente chuva, à medida que fui baixando. Mas, logo cessou e prossegui meu caminho até CHALUANCA, um vilarejozinho a mais ou menos uns 2600 m de altitude, onde me hospedei no hotel PLAZA... Ah, nada a ver com o Plaza de New York.













Ao chegar, encontrei um casal de ingleses que também viajava de moto. Eles estavam indo em direção oposta a minha, já haviam passado por Cusco e tudo mais. Jantamos juntos e peguei com eles várias dicas sobre a Bolívia e a Argentina. Ele, Peter, está viajando há quase seis meses e já foi até o Ushuaia. Sua namorada está com ele há somente três semanas e já vai ter que retornar a Londres em alguns dias.












Jantamos e demos uma caminhadinha pela cidade. Na praça central, onde há uma estátua de Simon Bolivar, um grupo de meninos brincava e rolava no chão, com uma felicidade que há muito não via.






















Todos estavam especialmente imundos! Queria tirar uma foto com eles, mas, estavam tão excitados com a fotografia que o máximo que conseguir fazer foi tirar uma foto deles e tive que quase sair correndo porque, depois, me cercaram e queriam ver a foto de todo jeito! Puxa daqui, empurra dali e quase me arrancaram a câmera da mão. Llindos, todos eles!












Cinco minutos depois conseguir desagarrá-los de meu pescoço e observei os adultos rindo e sorrindo pra mim. Que legal!!! Retornamos à porta do hotel e logo, logo nos retiramos. Essa manhã, arrumei tudo e fui tomar um café no restaurantezinho abaixo do hotel, onde conheci um senhor que me falou de umas ruínas, maiores que Machu Pichu, às quais só se chega caminhando pelas montanhas e tem-se que partir de um vilarejo chamado SAN PEDRO DE CACHORA. Supostamente, essas ruínas são três vezes maiores que as de Machu Pichu, e pouca gente as conhece. São mais ou menos uns 34 km de caminhada pelas montanhas nevadas até CHOQUEQUIRAO ou CHOKEQ’IRAW, a cidade que foi descoberta e virou rota para turistas desde 1992, não há muito tempo, mas que não é tão visitada devido à dificuldade de acesso. Bom, tomei meu cafezinho e saí em direção a ABANCAY, a estrada de Chaluanca ate Abancay e - uma coisa maravilhosa - são mais ou menos 120 km de estrada perfeita, sem trânsito algum, com muitas curvas, poucas subidas, acompanhando um rio maravilhoso em todo seu trajeto.













Ao chegar a Abancay começa a subida da cordilheira novamente, e as temperaturas começam a cair. Em um trecho de 30 km, subi de 2600 m a mais de 4000m, e as montanhas cobertas de neve começaram a reaparecer e a ficarem cada vez mais próximas.













Em um ponto do caminho, vi um cruzamento com uma plaquinha que dizia: CACHORA. Aí, lembrei-me das palavras do senhor no restaurante esta manhã e resolvi pedir informação a algumas pessoas que ali no cruzamento estavam a conversar. Confirmaram tudo o que já tinha ouvido e então resolvi tomar caminho até Cachora. Peguei uma estradinha de terra, cheia de cascalho, descendo a serra, onde a cordilheira e suas montanhas cheias de neve me enchiam a vista e me deixavam boquiaberto.












Quase chegando à Cachora, passei por um outro vilarejozinho, onde um mochileiro estava em pé, em uma esquina. Parei e acabei descobrindo que ele trabalhava para o governo do Peru, em desenvolvimento turístico, especificamente para a região de Choquequirao. Ele me passou algumas informações, inclusive que meu pneu traseiro estava vazando ar!!! Putz… naquele minuto mesmo havia entrado um prego de uns 10 cm no meu pneu novinho!!! Tirei as ferramentas de minha bagagem e em uns 10 minutinhos já havia tirado o dito cujo ( o prego) e arrumado o vazamento. Assim que terminei, saiu uma tropa de crianças de um colégio e logo me rodearam. Pareciam formiga em pote de mel, brincando, sorrindo, perguntando etc… E, quando disse que queria tirar uma foto deles …putz, que loucura!












O plano inicial era pôr a máquina no tripé e tirar uma foto COM eles, mas, o entusiasmo era tanto que eu mal consegui que eles ficassem a três metros de mim para que pegasse todos na foto! Hahaha, eu dizia: Fiquem aí, não se movam!! Eu dava dois passos pra trás, e eles, dois pra frente. Tentei falar novamente; dei mais dois passos para trás, e eles mais três à frente… estavam grudados em mim, até que consegui meio que correndo dar uns cinco passos atrás e tirar uma fotinho ‘mais ou menos” e, um segundo depois, já estavam todos ao meu redor. Nem consegui tirar a foto com eles, como eu queria.





















Segui em direção a Cachora, um vilarejo pequeniníssimo, ao pé do NEVADO (LINDO!), onde cavalos, mulas, vacas, cachorros e somente NATIVOS ocupavam as ruinhas: só eu de turista! Achei um hotelzinho e daqui me encaminharam tudo para a jornada de amanhã.














Já com o guia, fizemos uma lista das coisas que precisaríamos: comprei tudo para alimentação minha e do guia por quatro dias. Depois, dei uma caminhada pela cidade e, ao entrar numa vendinha, vi uma ovelha, que se chama “Jorge”. Sim, isso mesmo, um bichinho de estimação que anda livre pela rua e dentro das casinhas e vendas da cidade!


Seu Jorge...















Ele acha que é o irmão dele
Amanhã cedo, eu, o guia e um cavalo que levará nossos mantimentos, sairemos daqui cedinho, dormiremos no meio do caminho e somente no outro dia alcançaremos as ruínas. Bom, isso conto com mais detalhes depois. Dei uma ligadinha pra casa, rapidinho pra dizer que não vou poder dar sinal de vida por uns cinco dias, e que era pra tchurma não se preocupar. Ao retornar, no domingo, vou para Cusco onde reencontrarei meus colegas ingleses.
Boa noite!!! Tenho que dormir porque amanhã vou caminhar demais! Fui!